sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O começo

É assim que começa.
Um acaso do destino que fez colocá-la no mesmo lugar que você. Um olhar despretencioso, apenas notando sua presença. Um segundo olhar dessa vez retribuído e pronto, trocas de olhares seguidas.
É o começo...

É assim que começa.
Quando qualquer desculpa, por mais esfarrapada que seja, torna-se um motivo para tentar dar início a uma conversa. É quando você descobre o que há de mais básico: nome, idade, o que faz da vida, de onde vem, se come arroz por cima do feijão ou feijão por cima do arroz.
É o começo...
E você também tem que responder sobre você mesmo e a cada pergunta dela surge a preocupação sobre o que ela vai achar das respostas. Talvez você seja muito novo, talvez muito velho, talvez ela saiba que sua faculdade não é tudo aquilo que dizem, talvez ela te odeie por você esparramar o feijão no prato antes de pôr o arroz. Mas tudo isso é vencido e vocês percebem que têm muita coisa em comum.
É o começo...

É assim que começa.
Vocês marcam um primeiro encontro oficial. E qualquer programa é válido. Um sanduíche, um sorvete, um passeio no parque, um açaí, um cinema talvez...
É quando rola um nervosísmo, uma insegurança e toda a sua desenvoltura vai embora pelo ralo.
É quando você se sente um completo idiota pela última frase dita, a qual você gaguejou na primeira palavra, trocou a segunda e demorou pelo menos 5 segundos (que pareceram minutos) para lembrar da terceira.
É o começo...
E é quando ela se distrai com qualquer bobeira em algum canto e você, enfim, analisa com esmero todas as sinuosas curvas que compõem aquele corpo a sua frente. E quando ela volta sua atenção para você e retoma o raciocínio é a hora que você simplesmente não ouve nada que ela fala pois está com os olhos fixos naquela boca que, a essa altura, já não vê a hora de beijar. E malandramente você deixa transparecer seu olhar de forma que ela perceba que aquele assunto já deu o que tinha que dar e parta para aquilo que ambos sabem ser o motivo principal do encontro.

É assim que começa.
De uma hora para outra, vocês estão de mãos dadas e você torce para que ela não perceba que suas mãos estão mais suadas que aquele seu tio churrasqueiro ao final do futebol. É a hora que o coração dispara e você respira fundo porque sabe que no próximo minuto não terá essa chance de colocar tanto oxigênio de uma só vez para dentro do seu corpo.
É o começo...

É quando vocês se aproximam lentamente, olho no olho. Seus narizes se tocam, os olhos se fecham e em segundos a distância que separava suas bocas se reduz a nada.
Finalmente o beijo que vocês tanto esperavam.
Finalmente.

E é assim que começa...
É o começo de uma nova desilusão.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Acerto de contas

Tudo planejado.
O encontro estava marcado para às 20h no apartamento dela. Ele colocou sua melhor roupa, sua blusa verde favorita, seu melhor perfume e, pela primeira vez, não chegaria atrasado. Tudo tinha que ser perfeito para aquele momento e nada poderia atrapalhar.

Os dois não se viam há mais de um ano. Antes disso, se amavam feito loucos e, nesse meio tempo, a saudade sempre os acompanhou. Como seria agora, eles não faziam a menor idéia.

...

Depois de 40 minutos que saiu de casa, exatamente às 19h58, ele tocou a campainha do apartamento 121. Ela abriu a porta e fez perceber que continuava do mesmo jeito, apesar da tinta no cabelo. Ainda era o tipo de mulher ideal para ele.
Cumprimentaram-se.
Ela usava um vestido vermelho, com detalhes brancos. Ele nunca tinha a visto de vestido, daquele jeito e com aquela elegância. Com toda certeza ela também esperava bastante daquela noite.

Por um instante, no começo da conversa, sentiram o estrago que a distância e o tempo fizeram com os dois. Faltava assunto, faltavam palavras, sobrava timidez.

Nada que 15 minutos de conversa, espera e ansiedade não resolvesse. Entregaram-se àquela que havia sido a paixão mais arrebatadora de suas vidas.
Desde que haviam se reencontrado, 15 minutos bastaram para que a timidez estivesse no chão. Desde que começaram a se beijar, 10 minutos bastaram para que estivesse no chão o vestido vermelho, a blusa verde e qualquer outra vestimenta que usavam.

Mesmo tendo se amado tanto, por tanto tempo, aquela era a primeira vez que deitavam-se juntos. O calor do momento não permitia que nada do passado viesse a tona. Não permitia que vissem, ouvissem e sentissem nada a não ser aquele momento único de prazer que era proporcionado por suas antigas paixões.

...

Algum tempo depois, eles riam. Riam por tudo e por nada. Riam por não fumarem, riam da janela entreaberta, riam da camiseta que acabara de ser vestida ao contrário. Riam do que tinham acabado de fazer. Estavam felizes e satisfeitos.

Terminou de se vestir. Despediu-se dando um último beijo, dessa vez no rosto dela, e saiu do apartamento.
Saiu para nunca mais voltar. Os dois sabiam que dali por diante nunca mais se veriam e, se por um acaso do destino ainda se encontrassem novamente, nunca fariam o que tinham feito.

O amor e a paixão que uniram os dois há tanto tempo já estavam mortos e enterrados há quase um ano.

Saiu do apartamento e sorriu.

Olhou no relógio e começou a correr. Estava com pressa. Ainda tinha que passar em casa e tomar um belo banho antes de se encontrar com sua namorada, às 23h no outro lado da cidade.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Sobre o futuro

Tantas coisas, tantas situações, tantas confusões...
Tantos tantos que se viu perdido.
Só lhe restava o futuro como esperança ou consolo. Pôs-se a pensar em tudo que poderia ser e tudo que não mais seria. O que ganhava e o que perdia.
No entanto, este pouco que sobrava também não o satisfazia.

O futuro não existe. É ilusão. Pensar no futuro é tão vazio como não pensar em nada. Amanhã, minha vida pode estar acabada embaixo de um ônibus, num hospital sujo ou até mesmo no conforto do meu lar. De que valeu, então, planejar e vislumbrar tanto?

Ele não queria ser tão trágico.

Tudo que podemos querer, um dia, são situações para serem vividas no presente. Agora. Só isso importa. Nunca sentiremos agora o que sentimos há um mês, tampoco sentimos o que sentiremos daqui um mês. Sentimos o que acontece agora, no presente.

Também não queria ser tão profundo e raso ao mesmo tempo, nem tão filósofo, nem tão chato...

O que quero dizer é que se a gente não viver o presente, não aproveitar cada momento... o momento seguinte pode não acontecer e o que passou não volta mais.

Ele não queria dizer nada, para ninguém, sobre o que deveriam fazer. Apenas queria alguma conclusão para seguir em frente.

E tentava fazer isso com o quase-nada que tinha em mãos, tentando se desvencilhar dos maus sentimentos e pessimismos que o cercavam.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Ao final do corredor à esquerda

A escuridão, o silêncio da música terminada, o conforto.
Uma luz vermelha-piscante marcando o horário errado, um barulho chato de crianças brincando e gritando em algum lugar, o desconforto.

Um lápis, um caderno, uma barba coçando implorando o próprio fim, um olho seco suplicando por mais uma gota de colírio.

Um aparelho de som desligado, confusão, um instrumento musical não tocado, confusão, uma carteira de motorista não usada, confusão, uns trabalhos não aproveitados, confissão.

Uma caneca de cerveja: vazia. Uma praia paradisíaca: em um quadro. Uma porção de CD's: ruins.

Um boné, um óculos, uns sacos plásticos jogados, umas roupas coloridas espalhadas. A bagunça mental.
A dúvida, o medo, a incerteza sobre as conclusões e sobre a (in)capacidade de julgar o que é, ou não, melhor. A bagunça material.

Um texto cheio de artigos indefinidos.
Uma cabeça cheia de situações indefinidas.

A janela aberta, as paredes claras, a porta fechada, a cama macia e, principalmente, ocupando o maior espaço,

a ausência dela.

Tudo isso no mesmo quarto.

domingo, 3 de agosto de 2008

Pensamento perturbado

Sempre que eu penso demais
penso que não deveria estar pensando e,
pensando assim,
faço coisas sem pensar,
afinal
quando penso demais
desisto de fazer o que tinha pensado.
Por isso,
desde então,
desisti de pensar.
Mas...
Pensando bem,
nunca há o que pensar.
Só há o que fazer.

Ou então não tem nada a ver, sei lá, só pensei nisso...

terça-feira, 1 de julho de 2008

Uma noite (ou um homem) comum

Era natal e ele não estava nem um pouco satisfeito com o ano que estava prestes a virar passado. Olhando pela janela, vendo as luzes enfeitando as árvores, sentiu uma vontade absurda de sair andando pela cidade. Completamente sem rumo, pegou seu maço de cigarros, tomou um copo d'água e saiu de casa.

Andava e andava e sentia que não saía do lugar. As mesmas árvores tortas, o mesmo asfalto sujo, a mesma falta de flores em seu caminho. Por um instante achou que estava perdendo tempo, mas continuava a caminhar, enquanto os fogos de artifício estouravam por toda a parte anunciando o ano novo. Pessoas vestidas de branco passavam por ele com um largo sorriso no rosto.
Sentiu não merecer tudo que tinha. Sentiu o vento refrescando sua pele. Não sentia sono, nem fome. Apenas uma vontade louca de fumar. Seu cigarro, antes sua única companhia, ficara no ano que se foi.

Respirou fundo depois de tropeçar em todas as suas feridas mal cicatrizadas. Não ouvia mais as vozes que, em sua cabeça, diziam para ele ser isso e fazer aquilo. Apostou que essas vozes desapareceram depois de tantos quilometros sendo ignoradas.

Sorriu, enfim. Como não poderia sorrir com aquele clima alegre que tomava conta das ruas?! Era carnaval e ele sentiu que fazia parte daquela festa. Lembrava de tudo que tinha passado. Seus amigos, amores, casas, medos, viagens, trabalhos, risadas, conquistas, decepções, sensações experimentadas...

De repente, tudo era novo. As flores apareceram. As estrelas também. A lua, quase cheia, avisava que era Páscoa. Parou. Estava em uma praça florida. Deitou, cansado, e olhando aquele céu incrível, adormeceu.

Acordou com os primeiros pingos de chuva batendo em seu rosto. Demorou até se lembrar onde estava e por quê estava ali. Essa última pergunta, aliás, ele não soube responder. Levantou-se pensativo e tomou o rumo de volta para sua casa ensopado pela tempestade que caía. Cruzou com as árvores tortas e viu toda a sujeira do asfalto ser varrida pela correnteza que se formava nas sarjetas. Lavava corpo e alma.

Amanhecia. As luzes de natal que enfeitavam casas e postes, davam lugar aos raios solares. Era véspera de natal e ele chegava em casa com a sensação estranha de que perdeu um ano com pensamentos e divagações banais. Uma nostalgia que ele não precisava. Tomou um banho, acendeu um cigarro e foi para a janela pensar na vida e planejar o ano novo...

sexta-feira, 25 de abril de 2008

É que às vezes eu esqueço que tenho um blog...

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Metáforas paraquedistas - Parte II

Ele resolveu esperar. Talvez não tenha resolvido nada e talvez não tivesse o que fazer. Poderia, sem saber ao certo, já ter pulado.

Mas o fato é que era teimoso e não desceria.

Não desistiria sem antes ver onde aquilo ia dar.
E não precisou de muito tempo para que ele tivesse certeza do que queria e de que em hipótese alguma sairia pela tangente.
Ele queria voar e o faria cedo ou tarde. A qualquer custo.

Não minto que ali, por trás de suas convicções e de seu otimismo, não havia dúvidas. Nem que não havia medo de não conseguir e de ser tudo em vão. Havia. Mas naquela noite, depois daquela conversa e daquele momento, ele passou a ter certeza.

Uma certeza que seus pés não encontravam o chão e que, depois de muito tempo, ele havia se deixado voar.
E a alegria tomou conta dele quando percebeu que, talvez pela primeira vez, não voava sozinho.

Eram dois voando alto e se divertindo sem saberem ao certo - e sem se preocuparem - se chegariam no chão ou na Lua. O que importava é que estavam juntos, desbravando o céu. O tempo se abriu dando espaço a uma sensação nova, que só eles podiam sentir.
Ele se orgulhava.
Ela surpreendia-se consigo mesma.
Flutuavam.

E onde isso tudo vai parar? Eles não querem saber. Só querem continuar voando por aí...

quarta-feira, 5 de março de 2008

O cão velho e o vendedor de canetas


Lá vinha ele novamente.
Eu lá, sentado no degrau de uma casa, em minha rotineira espera de ônibus e comecei a reparar naquele cão que todos os dias vinha em minha direção, levado pela empregada de sua dona.
O ponto de ônibus estava cheio e ele, o cão, não parecia querer passar por lá. Ele não parecia querer passar por lugar nenhum, na verdade. Seu cansaço e desânimo estavam por todo corpo, mas especialmente seus olhos, fundos, transpareciam um desejo inconsciente e reprimido de não mais viver.
Todos ali parados não paravam de olhar. Suas pernas fracas mal suportando o peso de seu corpo, sua cabeça baixa, seus músculos trêmulos, seu andar vagaroso e inconstante. Parecia buscar ar a cada vez que parava de caminhar e sua respiração, ofegante, chamava a atenção de todos os presentes que, sem querer, paravam no tempo para observar e ter pena daquela situação. Lentamente ele se afastou até sumir de vista.


Horas depois, em outro ponto de ônibus (agora voltando pra casa), olhei pro lado e vi um velho. Já havia o visto algumas vezes nos arredores da Paulista. É um senhor bem velho mesmo!
Todos os atributos que citei acima, me referindo ao cão, podem ser perfeitamente aplicados a ele também. Mas tinha uma diferença: o cachorro passeava (mesmo que isso fosse um esforço), apenas.
Já o velho, carregava peso.
Estava trabalhando.
Vendendo canetas, para ser mais específico.
Por quê? Não sei, e aposto que muita gente que o viu também já se fez essa pergunta.
O cachorro, por mais debilitado que estivesse, recebia todo o cuidado de várias pessoas (dona, empregada, possível filho da dona, enfim). Já o senhor... trabalhava para se manter? Para manter outros, o que seria pior?
Não quero entrar em questões sociais para esse texto não ficar gigante e mais chato do que já deve estar.

O que quero dizer, finalmente, e concluí depois de ter visto e analisado as duas situações que contei, é que devemos viver intensamente cada segundo dessa vida. Aproveitar o máximo possível da força que temos em nossos 20 e poucos anos (ou nem isso) (sim, meu público é segmentado). Fazer de tudo para não deixarmos escapar aquilo que queremos muito, por medo, preguiça ou comodismo. Enfim, viver de verdade!

Afinal, estamos todos sujeitos a passar os últimos dias velhos, como um cão que ninguém nunca imaginou que fosse ficar daquele jeito, e abandonados, como um cansado e solitário vendedor de canetas.

E a fonte da juventude não funciona nem no desenho do Pica-Pau...

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Metáforas paraquedistas

Eu me vi lá no alto, na beirada. Não sabia se me jogava, se descia pelas escadas, ou se ficava parado por lá esperando acontecer alguma coisa.

Mas a real é que a gente nunca decide o que fazer nessas situações.

Eu já voei tanto, caí tanto e doeu tanto que nunca mais pulei de grandes alturas. Esse período me serviu para cuidar e praticamente reconstruir minhas asas machucadas.
Na verdade ainda não sei se estou pronto. Na verdade eu já não sei, também, nem se meus pés ainda estão no chão.

A primeira providência para voltar a voar seria achar condições propícias para um vôo seguro, ao contrário dos meus vôos anteriores. E essa etapa eu já pulei.
É por consequência desse pulo que minha cabeça recebe diárias e inconscientes doses de "você não pode pular!".
Que sina de só querer lugares difíceis para voar. A culpa não é minha, juro! Tudo estava tranquilo quando cheguei. O tempo virou e eu não pude fazer nada, mas, ainda assim, resolvi ficar fiquei.
Afinal, apesar das condições adversas, eu senti e sinto certa segurança, além de ter adorado o novo local.

Foi aí que eu me vi lá no alto, na beirada, e não sabia se me jogava, se descia ou blá blá blá.